segunda-feira, 17 de novembro de 2008

PERCURSO DE UMA AULA DE SUBSTITUIÇÃO

"Também as aulas de substituição foram ridicularizadas e hoje ninguém fala disso. Foi necessário que o Ministério e a ministra resistissem. Resistimos e vencemos!" Esta frase, sintacticamente define bem o perfil da Sra. Ministra: Venceremos! Já parece um anterior dirigente do PS que afirmou "quem se meter com o PS, leva!".

Na realidade só quero lembrar a quem já "esqueceu" as críticas feitas às aulas de substituição e, principalmente aos pais (os principais iludidos e enganados pelo actual sistema educativo), que estas aulas, na maioria dos casos (em que oiço comentar), servem apenas para "prender" os alunos nas salas de aula. Senão, vejamos: um professor falta inesperadamente e, ao fim de 5 minutos é chamado um outro para proceder à substituição. Esse professor, sai do local onde se encontra, vai buscar uma ficha de trabalho inerente à área disciplinar que o professor faltoso deveria leccionar naquele momento. Estas fichas são produzidas pelos professores de cada área disciplinar e são colocadas no dossier de cada turma para a eventualidade de algum professor faltar. Continuando… após estar na posse da referida ficha, vai à reprografia, onde, com carácter de urgência, se fotocopiam o número de fichas necessárias para o professor substituto aplicar (não é leccionar, note-se) aos alunos do colega que faltou. Com isto, perdem-se entre quinze a vinte minutos de aula. Esses 15/20 minutos, são o verdadeiro pandemónio orquestrado pelos alunos que aproveitam a ausência de professor para gritar, pular e tudo quanto se possa imaginar, não obedecendo aos apelos proferidos pelo funcionário e, por vezes, dos professores que tentam leccionar nas salas contíguas. Finalmente, quando o professor substituto chega, começa a segunda fase da batalha. Esta, é tanto mais renhida quanto menos conhecido dos alunos da turma for o professor. É difícil aceitar na sala de aula um professor que nem pertence ao Conselho de Turma e muito menos, se este for desconhecido dos alunos. O desagrado é total e exprime-se muitas vezes por atitudes denunciadoras de uma grande falta de educação, respeito e de princípios básicos de convivência social. Quando, por fim, os ânimos se acalmam, o professor distribui as fichas de trabalho, independentemente de dominar ou não os conteúdos que está a aplicar. Pessoalmente, já fiz uma substituição em que fui aplicar uma ficha de inglês, área que não domino absolutamente nada.

A cada dúvida posta por um aluno sobre qualquer questão da ficha de trabalho, a imagem de ignorância sobre os conteúdos a explorar aumenta e, proporcionalmente, começa a aumentar nos alunos o espírito de contestação evidenciado por comentários animadores do tipo “se não sabe porque é que aqui está?” (é que o código de valores de alguns dos nossos jovens está muito aquém do respeito pelos outros). É fácil imaginar que, a partir daqui o pretenso rendimento que se poderia ter dissolve-se e volatiliza-se.

Findo o tempo da aula de substituição que pode ser apenas de 45 minutos (vejam o que rendeu esta substituição) os alunos vêm para o recreio. Se questionarmos os alunos acerca do que aprenderam/rentabilizaram naquela aula sobre os conteúdos que deveriam ser aplicados, estes não respondem… não há nada a dizer!

A estas “aulas de substituição”, onde um professor vai substituir um outro que faltou sem aviso prévio, chamam-se “Actividades Lectivas”. Como tal, as lições não são numeradas (ou seja, no balanço final do período – aulas previstas/aulas dadas, continua a haver um défice de aulas que deveriam ser leccionadas, mas o que é certo, é que os alunos (es)tiveram (n)as aulas todas na sala de aulas). Só são verdadeiramente aulas de substituição, devidamente numeradas e leccionadas por um professor da área disciplinar, quando há aviso prévio da falta do docente faltoso e este deixa um plano de aula onde conste o que iria leccionar nesse dia aos seus alunos – aqui sim, existe uma verdadeira substituição e os alunos não perdem com a ausência do seu professor, pois o que o substitui, sabe o que irá leccionar, já preparou a aula e, ao toque, apresenta-se na sala de aulas dentro do tempo regulamentar.

Esta é a realidade da VITÓRIA da Sra. Ministra da Educação e do Ministério.

Certamente que o que antes se aludia como ridículo, era a opinião dos professores cuja experiência já antevia algo do género.

No entanto, os professores continuam a tentar que as aulas de substituição frutifiquem, pois ainda existem alunos que tentam rentabilizar estas aulas. É pena tratar-se de um número incipiente face à maioria dos que, na mesma turma, tentam boicotar tudo, não permitindo que a minoria faça algo.

Às vezes pergunto-me se não seria melhor canalizar as minhas horas de substituição para dar apoio individual (tipo aulas extra) a alunos que tenham verdadeiras dificuldades às áreas disciplinares que lecciono e que se interessem por aprender e melhorar os seus resultados; ou ainda, ter uma hora extra destinada à minha função de Director de Turma para solucionar o problema de um “Manel” que provém de uma família desestruturada e passa a vida a bater aos colegas ou a fugir da escola, ou a dar apoio a uma “Maria” cujos pais estão em processo de divórcio e esta vive o horror do silêncio sem ter com quem desabafar. Poderia desfiar inúmeros casos problemáticos que infelizmente povoam a nossa sociedade/comunidade escolar e que necessitam mais do que uma hora semanal destinada à Direcção de Turma para serem acompanhados.

Enfim… no final desta reflexão, apenas me ocorre um provérbio (talvez por me encontrar exausto e de momento o meu cérebro precisar de descanso): “albarda-se o burro à vontade do dono.”


Mário Ferreira

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